O baiano

O baiano é um sujeito a parte dentre os brasileiros. Ao menos dentre os brasileiros que já tive oportunidade de conhecer ao longo desses 30 anos e quatro meses de vida. Distinto do rude gaúcho, do apressado paulista, do caipira mineiro ou do malandro carioca, para citar apenas alguns exemplos. O baiano, como toda cultura forte, tem seu jeito próprio, mas, acima de tudo, seu tempo e ritmo. O próprio sotaque não é necessariamente lento, mas cantado. E simpático.

O Brasil enquanto país, é bom lembrar, começou na Bahia, exatos 516 anos antes de eu iniciar a escrever este texto. E Salvador respondeu como capital brasileira por 214 anos, de 1549 até 1763 – até hoje é a cidade que mais ocupou este “posto” e seguirá assim até a segunda metade do próximo século. E é quase como se carregasse um traço de mãe-gentil desta pátria que o baiano age.

Com uma fala mansa e aquele dom de criar intimidade rapidamente, o que deve levar pessoas mais fechadas e/ou resguardadas a um certo ponto próximo do desespero quando chegam à maior cidade do Nordeste. Afinal, por certo são em poucos lugares onde o atendente ou garçom te chama de “amor” antes mesmo de qualquer pedido. E esse é só um mero e trivial exemplo.

Pecando pela generalização, mas todo o soteropolitano parece disposto a conversar ao menos um pouquinho com quem quer que seja, onde for.

O que, claro, não significa que os baianos sejam o povo mais feliz do mundo, quiçá nem do Brasil. Há mazelas, problemas, malandragens e maldades. Até, incrivelmente, racismo, escancarado na separação das quase 100 favelas da cidade e os prédios com vista para o mar. E também na pichação de protesto contra a truculência da polícia do Brasil, que teima em mirar negros, mesmo onde eles são maioria.

Porém, no geral, sem dúvida é uma gente hospitaleira e, coisa rara neste momento, livre de preconceitos xenófobos.

Eles têm fé, como aqui já foi citado. Na igreja, no candomblé… Não à toa que o mar que entra ladeando Salvador recebe o nome de Bahia de todos os santos.

Salvador desde sua fundação foi uma cidade cosmopolita. Aliás, interessantíssimo o artigo da Wikipédia sobre Salvador. Nele, o historiador Cid Teixeira compara o investimento inicial em Salvador, no século XVI, com a construção de Brasília, mais de 400 anos depois. “Não se tratava de um povoado que foi crescendo. A cidade já surge estruturada. Salvador não nasce de um passado, mas de um projeto de futuro que era construir o Brasil. Por isso desde o início, a influência internacional na realidade local está presente em Padre Vieira, Gregório de Mattos, cinema novo e a tropicália”, complementou escritor e estudioso da cultura baiana e da música brasileira, Antonio Risério, à revista IstoÉ, em 1999.

Mas ao contrário do que ainda é Brasília, um amontoado de povos sem uma característica convergente, o baiano tem personalidade e cor: ele é negro, receptivo, orgulhoso de sua cultura, adorador de sua terra e, claro, de sua praia. Com toda razão.

Tiago Medina: jornalista